A tragédia de Realengo completou mais um capítulo esta semana quando Wellington Menezes, autor dos disparos, foi enterrado. Ao contrário do que exigia em sua carta de despedida, pedia para não ser tocado por mãos impuras (não virgens, desde seu ponto de vista) ou adúlteras e repousar ao lado da mãe,Wellington foi enterrado como indigente e em outro cemitério. O destino traiçoeiro, o mesmo que ele reservou a inocentes que pagaram por seus delírios, seguramente optou por colocar em seu caminho mãos impuras - o que compete com exatidão a qualquer espécime macho que já tenha ultrapassado os 14 anos de idade - e adúlteras – que, convenhamos, em uma sociedade machista e hipócrita como a nossa, é absolutamente normal. O que não percebemos dentro desta linha de raciocínio e do ensino que atribuímos às nossas crianças é que estes conceitos, incluindo a segregação e o preconceito, se misturam, criando monstruosidades adormecidas que espalham pânico e pavor no momento em que despertam.
Wellington é cria de um sistema cruel que privilegia indivíduos desvirtuados desde o início e que é incapaz de corrigir suas próprias falhas. Um sistema que depende da exploração ilimitada para sobreviver e se perpetuar, como a cobra que come o próprio rabo. É ele quem incentiva a competitividade a todo custo, ainda que isso crie um abismo colossal entre aqueles que são aceitos e os que por ele são rejeitados. E é nesta divisão, suportada pelo preconceito, que surgem os primeiros sinais dos pequenos monstros que criamos.
Wellington foi vítima de bullying na escola, tendo sido inclusive atirado diversas vezes dentro de uma lata de lixo (de maneira figurada, passava a representar o que aquela escola tinha de pior). Claro que uma situação constrangedora na infância não faz dele vítima eterna nem justifica o ato insano, mas dá mostras do quanto a sociedade está despreparada para lidar com indivíduos cujos distúrbios são conseqüência de sua própria perversidade. Houvesse outra forma de preparo, conscientização e acompanhamento e muitas das tragédias poderiam ser evitadas.
O caso Wellington suscita dois pontos: 1. O que leva um grupo de crianças a jogar um colega dentro de uma lata de lixo? 2. Em que consiste um sistema de ensino que não consegue evitar este tipo de procedimento?
A primeira questão é fácil de responder: moldada nos padrões do preconceito, indivíduos “menos qualificados” (sem acesso ou com acesso restrito aos bens que a sociedade proporciona, como tênis e celulares, ou fora do enquadramento estético padrão, os gordinhos, feinhos, quietinhos e afins) são ‘filtrados’, viram motivo de gozações e todo tipo de provocações. São colocados à margem porque representam o anti espelho, ou tudo que o grupo ao qual pertencem não quer ver (até para não denegrir sua própria imagem). Fosse Darwin vivo e estaria testemunhando, com extremo desprazer, sua teoria da evolução aplicada da forma mais banal no futuro de nossa raça.
A segunda é um pouco mais complexa, mas dá mostras do quanto nosso ensino encontra-se despreparado para criar indivíduos gregários e conscientes (e que representariam o fim do que o sistema se propõe a perpetuar, um contra senso por princípio). Incentivamos a competitividade, segregamos o diferente e banalizamos suas emoções, cercando de preocupações somente aqueles capazes de sobreviver e vencer. O perdedor? Quem tinha noção que suas angústias poderiam levar ao extremo?
Somos todos responsáveis por aqueles que são atirados ao lixo. Monstros como Wellington são fruto das distorções que criamos para manter nosso sistema ativo e somente mudanças estruturais, não políticas de controle ou campanhas de desarmamento, mudarão o cenário. Enquanto isso, seguiremos contribuindo para a gestação destes miseráveis...
We don't need no education
We don't need no thought control
No dark sarcasm in the classroom
Teachers leave them kids alone
Hey! Teacher! Leave us kids alone!
All in all you're just another brick in the wall
All in all you're just another brick in the wall
(Pink Floyd, Another brick in the wall)
Olá,
ResponderExcluirO amor constrói e a falta dele só pode dar nessa tragédia horrenda...
Abraços fraternos e ótimo fim de semana.