Não acho, sinceramente, que
exista corrupção na política. O que eu acho é que existe política na corrupção.
Sim, porque a corrupção é endêmica, atávica, enraizada na população como um
todo e não faz distinção entre classes, apenas se vale de meios e proporções
diferentes. A verdade é que, em maior ou menor escala, toda sociedade é
corrupta.
A associação natural que se faz
ao termo corrupção é a que remete ao poder público, à troca de benefícios por vantagem
econômica. Um servidor que facilita a emissão de um documento em troca de dinheiro,
um fiscal que faz vista grossa a uma infração em troca de dinheiro, um
parlamentar que recebe dinheiro de empreiteiras em esquema de lavagem que hoje
chega a milhões de dólares. Bando de corruptos – sim, eles são – e merecem ser
punidos por seus crimes. Mas embora esta seja a associação clássica (atitudes
ilegais baseadas em ganhos financeiros), não é aí que o termo se encerra. Corrupção
é a antítese do que nossos avós costumavam chamar de ‘bons costumes’, a traição
aos princípios morais que deveriam reger o comportamento humano e sua conduta em
sociedade. Não se trata apenas de barganhas em nome do dinheiro, mas tudo que
diz respeito a obter vantagens por meios não convencionais (e nem sempre
ilícitos); não se trata apenas de corromper terceiros através de seus desejos, senão
corromper a si mesmo pelos mesmos motivos.
Exemplos não faltam. O carro da
madame na vaga de deficientes, a fila dupla na porta da escola, a torcida que
pede pênalti quando nem falta foi. Outro dia esperava eu pacientemente pela
pista central da Dr. Arnaldo que dá acesso à Consolação – lembrando que a pista
da esquerda segue para a Av. Paulista ou é exclusiva aos ônibus que trafegam
pelo corredor – quando um pelotão de carros vem cortando pela esquerda.
Sarcasticamente, o carro que me fecha e ocupa meu espaço tem um adesivo em tons
azuis em que se lê ‘Eu apoio a Lava jato’.
Corrupção grande não pode,
pequena pode. O deputado não pode tomar seu dinheiro, mas você pode tomar o
espaço do outro carro. Ou adulterar o cartão de zona azul, parar o carro em
duas vagas, não respeitar a faixa de pedestres porque sua pressa é sempre mais
importante, zerar seus pontos da carteira de motorista com o despachante que
conhece alguém no Detran (o trânsito é sempre um bom referencial para
demonstrar o quanto somos civilizados). Não é de valores que estamos falando.
Aliás, é. Não de valores monetários, mas daqueles que deveriam estender seu
direito até onde começa o do próximo. Mas isso é corrupção? Na medida em que
você contraria suas normas internas, fazendo algo que inconscientemente sabe
que não deveria fazer, você está corrompendo seus próprios valores. A não ser
que você não esteja nem aí pra nada (como deve ser o caso do dono do veículo
que ilustra esse post).
Como então exigir lisura e ética
de políticos se as falhas de caráter são as mesmas, apenas com instrumentos e amplitudes
diferentes?
A base está na educação. A do
Brasil é digna das sociedades mais atrasadas do mundo, tanto em conteúdo quanto
em estrutura. Não formamos mão de obra qualificada, muito menos cidadãos. Somos
o Brasil colônia com ares de modernidade, mantendo o mesmo caráter predatório e
escravagista, embora subjetivamente. Temos condições de melhorar em 200, talvez
300 anos, desde que o processo se inicie já. Se aliarmos a este aspecto um
processo de controle mais rigoroso também teremos melhores resultados. O que
temos por hora é uma sociedade fracassada onde impera a corrupção moral – a começar
pelo afiador de facas comprado pela presidência da república no valor de R$ 9
mil. Vai dizer o quê?
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