19 de abril de 2009

À espera dos bárbaros

Obra do sul-africano J.M. Coetzee, nobel de literatura em 2003, À espera dos bárbaros encontra-se entre meus livros de cabeceira. Não é de tirar o fôlego - e nem é essa a proposta - tampouco cria o clima intenso que obriga o leitor a andar com o livro debaixo do braço. Mas é de um primor narrativo extraordinário, principalmente no que tange às passagens descritivas, como se fosse possível extrair a textura de cada cena através das palavras. Talvez seja este o grande desafio da arte de escrever: transpor o leitor para o ambiente mágico desenhado pelo autor, onde cada elemento ganha vida exatamente como foi imaginado. Para quem escreve, e sabe que o aprimoramento vêm do exercício e da leitura, taí uma ótima referência. "Toda manhã o ar está cheio do bater de asas dos pássaros que voam para o sul, circundando acima do lago antes de se instalar nas ramificações salgadas dos pântanos".
"A chegada dos primeiros pássaros migratórios confirma os sinais iniciais, o fantasma de um novo calor no vento, a transparência vítrea do gelo do lago".
"De horizonte a horizonte a terra está branca de neve. Ela cai de um céu em que a fonte de luz é difusa e presente em toda parte, como se o sol tivesse se dissolvido em neblina, se tornado uma aura". "O sol subiu, mas não fornece calor algum. O vento que vem do lago bate em nós, trazendo-nos lágrimas aos olhos. Em fila indiana, quatro homens e uma mulher, quatro animais de carga, os cavalos insistindo em ficar contra o vento e tendo de ser virado na rédea, serpenteamos para longe da cidade murada, dos campos nus e, por fim, dos meninos ofegantes." "Até onde se pode ter certeza , a primavera chegou. O ar está perfumado, as pontas verdes dos brotos novos de grama estão começando a aparecer aqui e ali, bandos de perdizes do deserto voam à nossa frente". "um torpor já está começando a baixar sobre a cidade. O trabalho da manhã terminou: antecipando o calor do meio dia, as pessoas estão se retirando para seus quintais sombreados ou para o frescor de salas internas. O marulhar da água nos sulcos da rua se aquieta e para. Tudo o que escuto é o tinido da martelo do ferreiro, o arrulho dos pombos e, longe, em algum lugar, o choro de um bebê".

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