Tênue é a linha que separa indignação de revolta. No primeiro caso, levantamos palavras de ordem para protestar contra a administração pública que, ciente da situação, optou pela inoperância. No segundo, rasga no peito o desejo de armar-se com paus, pedras, facas e tudo mais que estiver à mão para invadir o congresso e botar todo mundo pra correr. O Brasil precisa, URGENTEMENTE, de uma revolução, de gente que tenha brio para derrubar as instituições que se fartam do poder por séculos e nada fazem diante de situações que não lhes diz respeito. A tragédia anunciada no RJ vem, uma vez mais, corroborar a tese de que as catástrofes só acontecem porque o que se desenha incialmente como manifestação da natureza ganha proporções absurdas - o número de mortos passará de 600 - porque não há estrutura necessária para evitá-la. E por que? Vejamos:
1. O governo do estado, que encomendou um estudo geológico sobre a região em 2008, sabia das condições de risco a que estava exposta a população serrana do Rio
2. Mesmo diante da constatação, não foi capaz de remover as famílias das áreas. O processo é lento e burocrático, exige a autorização das famílias e a remoção para outro lugar. Diante da resistência imposta por estas pessoas e pelo penoso processo de PLANEJAR (onde colocaremos todo mundo?), é mais fácil optar pela inação
3. As populações carentes podem até ser responsabilizadas, ainda que indiretamente, mas é demais que o brasileiro (aquele mesmo que se espreme aos milhares em dia útil pra ver apresentação de Ronaldinho na Gávea) tenha a coerência e o discernimento para não morar em área de risco. Óbvio que ele gostaria de morar em Copacabana, Leblon ou Ipanema, mas levemos em consideração sua situação econômica para entendermos, com facilidade, porque são feitas essas opções.
4. "O Brasil conta com especialistas e tecnologia para enfrentar situações desta natureza. O que não possui é vontade política". Palavras da cientista belga Debarati Guha Sapir.
Entendo que este último ponto reflete com consistência a posição dos comandantes deste navio chamado Brasil, que por um lado luta para se inserir entre as potências do primeiro mundo e por outro mal sabe lidar com seus problemas de ordem estrutural. É de uma irracionalidade sem precedentes pensar em copa do mundo e olimpíadas enquanto há questões absolutamente mais básicas a serem resolvidas. Pagamos impostos à exaustão, não vemos reversão em nada. Enquanto isso, a corja que se instalou no planalto quer mais é regar seus fartos jantares com prosseco e fumar charutos cubanos, ganhar R$ 26.000,00 ao mês (sem contar as verbas para isso e aquilo, auxílio moradia e etc) e fazer-se valer de benefícios que nós mortais não dispomos. Essa semana mesmo uma procuradora do estado do Rio, suspeita de dirigir alcoolizada, não teve que se submeter ao teste do bafometro por sua condição (havia entrado na contra mão, batido em um ônibus e atropelado uma doméstica). De onde diabos alguém tirou - e alguns aprovaram - esse privilégio, que coloca acima da lei pessoas por sua formação, que na prática comete os mesmos crimes e não é penalizada? Tem filho de deputado atropelador na cadeia?
Ainda temos muito a aprender. Mas enquanto contarmos com que faz do poder sua fonte de recursos sem ilimites, dificilmente teremos um país saudável e que crie condições para sair do buraco. Programas assisstencialistas serão sempre moeda de troca: não tiro a água do pescoço, mas pelo menos não morro afogado.
A tragédia do Rio é fruto de uma tragédia muito maior que se desenrola em Brasília todos os dias.
Foto: Terra
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