2 de junho de 2009

Vida longa à tradição celta


"Evoco um passado distante. Distante no tempo e na razão, mas não nos caminhos que falam ao coração.


Sinto que estou perto, embora ainda não seja capaz de distinguir o trajeto com precisão. Estas árvores, espalhadas por todos os lados, insistem em me confundir. Mas meu instinto, em meu mais profundo íntimo, revela a força que se conecta a um outro lugar, a um outro ser, que neste momento não se encontra longe dali. Posso sentí-la com sua ansiedade contida, envolta em seu amor que aguarda em silêncio, sem saber ao certo quanto tempo se passou desde o início da minha jornada. E volto porque sei que a este lugar pertenço, que por mais que minha vida se desdobre em outras experiências que não estas terras sagradas, jamais hei de esquecê-la.


Nada se compara à vista destas planícies. O mar, o brilho da areia, as terras que sobem e se estendem pelo horizonte. Terras férteis, gentilmente agraciadas pelas mãos da natureza em sua esplendorosa bondade. Terra de aventuras e paixões, de danças e sagas, em cuja essência repousa o espírito das tradições celtas. Colina acima e tudo se enche de um verde fulgurante que perdura mata adentro e parece iluminar meu caminho. E quanto mais avanço, mais essa luz me aquece, como se tocasse meu rosto em busca de proteção, como se me chamasse de volta ao meu próprio lar...



Lentamente me aproximo. Observo a fumaça que emana ao longe e pareço sentir a presença dela. Seu aroma de maçã, seu olhar parece perdido na própria inocência. Fecho os olhos e me concentro na imagem que rodopia, braços abertos ao vento e sorriso fácil que acompanha o ritmo da música. Roda como se em minha direção caminhasse, como se pudesse sentir a presença de meu espírito a invocá-la, desejando-a em busca da unicidade como se há muito já estivesse escrito. Ela rapidamente joga o olhar para a porta, como se pudesse sentir minha presença. Joga o manto sobre as costas e sai, recolhe o olhar que colide com os raios de sol da manhã. Eles se acostumam e ela os dirige para o horizonte em busca de seu guerreiro distante.



Nada além da campina e da névoa que se perde no infinito. Por um instante ela sente o peso do corpo nos joelhos como se fosse desabar, uma vez mais, sobre o fardo da frustração. Diz para si mesma que se manterá de pé, segura de seu propósito e da existência do caminho. Quando a união se concretiza dessa forma, tenuamente equilibrada em filetes de energia e emoção, ela sabe: não há o que temer. Mas então ela baixa os olhos, uma vez mais enganada pela ausência. Prepara-se para retornar quando, em um último alento, lança o olhar em direção à campina. É então tomada pelo primeiro ardor que sai do coração, dá a volta pelo corpo e retorna como uma pequena bola de fogo. Em meio a névoa, algo parece surgir sem muita definição. O cavalo marrom, ela tem certeza. O passo torna-se trote, o trote galope. O coração dispara, a saudade parece ter ficado pelo caminho. O poder daquela energia nos teria feito levitar no espaço, entrelaçando nossos corpos até que se tornassem um só.



Lar. Um pequeno refúgio encravado nas montanhas, coroado pelo incessante tocar do rio em seu fluxo natural. Emociono-me ao sentir a energia que me toca o peito como se quisesse explodí-lo em súbito assalto de paixão. E ela está ali, parada na soleira, mãos cruzadas sobre o ventre, o cabelo angelical escorregando por sobre os ombros. Eu tinha certeza: era ela quem me guiava todo esse tempo. Emanava seu brilho, mantinha acesa a esperança que me trazia de volta, ainda que os deuses se pusessem em nosso caminho. Diminuo a marcha, não mais do que alguns metros nos separam. Nossos olhares se cruzam, a energia parece aumentar de intensidade. Desmonto. As botas sujas tocam o solo e me ajoelho sobre a perna direita. Cerro meu punho com força e o estendo à terra. Estou de volta.



Nossos movimentos são lentos. Caminhamos um em direção ao outro na certeza de que deixaremos para trás toda a saudade que o tempo nos relegou. Agora estmos um diante do outro, olhares fixos, sentimentos divididos. Silêncio. Minhas mãos deslizam sobre seu rosto, fecho os olhos e nossas frontes se tocam. E assim permanecemos pela eternidade recompondo nossas almas, realinhando nossas energias. A paz duradoura volta a habitar nossos corações. Nasce o abraço eterno, a luz assume tom claro e nos envolve por completo como se nada, nada além da oconsciência do compartilhar sem limites, pudesse existir naquele momento. Olhos nos olhos, lábios nos lábios, um leve rodopio no ar. O vestido acompanha o movimento na espiral de saudade que parece ter chegado ao fim.



Vida longa à tradição celta".




Que a extensão do fio mágico que conduz a vida, ignorando variáveis outras que não as virtudes de meus próprios sentimentos, sele o caminho que leva à eternidade.

11 comentários:

  1. André, tem um selo violeta para você no meu blog, passa lá, abs

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  2. Belíssima crônica ode às celtas tradições mio caro!
    Sintonia pura sim e sempre!

    Te abraço!

    Viva A Vida Meu Bom André!

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  3. E não é? O assunto parece ter tomado conta de nossos universos, ou nosso universo. Gde abraço, Ricardo, amiche mio!

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  4. que belo texto, tava inpirado hein?
    ; )

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  5. É, Cris, posso dizer que fui inspirado!

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  6. I know, I know...
    But it's nice to 'hear' it...

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  7. Tem coisas que acontecem na vida da gente só de vez em quando...

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  8. Annwyl cennad,

    Manwl rhyddiaith, barddoniaeth pur, llymanta pur. Sinto um arrepio ancestral. É a memória. Ou apenas o vento aqui nas terras altas, ucheldiroedd.

    Cus a cariad,
    Fabi

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  9. (risos)

    É gaélico, mais especificamente o galês... De todas as palavras, talvez a que te interesse mais é Cennad, que significa...mensageiro :)

    (Cennad é um bom nome para uma banda...que tal? Se bem que é parecido com o nome daquela primeira banda da Enya, era como mesmo? Clannad?)

    No mais, acho que o google translator e o babylon podem te ajudar...afinal um desafio linguístico é um ótimo programa para sábado :)

    â cariad,
    Fabi

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