9 de fevereiro de 2014

POR QUE O BRASIL NÃO DÁ -E PROVAVELMENTE NUNCA DARÁ - CERTO

O Brasil moderno é fruto de uma política de desenvolvimento predatório e depreciativo nascida nos tempos coloniais. Sim, somos herdeiros de um sistema selvagem que nunca privilegiou a sociedade como tal, mas castas e grupos políticos que se agarraram ao poder em busca de diferenciação e criaram, como consequência, os abismos colossais que se interpõe entre governantes e governados. Mas por que?

O país nasceu à luz de contrastes sociais gritantes. Quando um filho de Portugal resolveu declarar a independência, em 1822, muito mais por conflitos com a corte do que propriamente como um grito à liberdade do povo brasileiro, a pátria contabilizava mais de um milhão de escravos - que somados a índios, mestiços e mulatos representava 2/3 da população. Libertos 66 anos depois, muito provavelmente por pressões sociais que cedo ou tarde resultariam em uma insurreição gigantesca com graves consequências, ao invés do sentido romântico que se procurou criar através da Princesa Isabel e a Lei Áurea, iniciaram um processo de integração que nunca se concretizou. Juntamente com outros fatores que contribuíram para o desenvolvimento da sociedade - as ondas migratórias da Europa e Ásia, por exemplo - chegamos ao modelo do Brasil do século XXI, cheio de falhas, inconsistências e, sobretudo, desequilíbrio.

Creditar essas diferenças à exploração econômica do sistema capitalista como fazem hoje os black blocs ou os manifestantes contra a exploração do pré-sal, por exemplo, beira o ridículo. A livre iniciativa pressupõe a busca do lucro como forma de gerar excedentes, que por sua vez se transformam em riqueza tendo o monetarismo como pano de fundo. Assim se constroem as bases de sustentação econômica e a geração de empregos que mantém a sociedade ativa e a riqueza distribuída, certamente de acordo com o grau de participação de cada agente dentro do sistema. Cabe ao governo, como agente regulatório, fiscalizar e alimentar a engrenagem, fazendo com que a lei se cumpra e usando a parte que lhe cabe neste mecanismo, coletada na forma de impostos, para garantir os pressupostos básicos da vida em sociedade: educação, moradia, segurança, atendimento médico e saneamento básico. Não apenas servir ao cidadão, mas também capacitá-lo como mão de obra para que gere benefícios a si mesmo e ao desenvolvimento da economia do país como um todo.

Nada disso acontece. O modelo que se criou foi responsável por perpetuar estas diferenças por duas razões básicas. Primeira: o governo não cumpre a sua parte. Segunda: é usado como trampolim para os que veem na máquina administrativa a abertura necessária para amealhar suas pequenas fortunas, assim como fizeram recentemente os fiscais do ISS. A regra de distribuição de riquezas não se cumpre e a promessa de uma sociedade justa não passa de ilusão. Indo além, há que se ressaltar o papel da oposição nesta história toda, ela que em tese critica o modus operandi governamental e apregoa os fundamentos de uma sociedade justa. Este foi o papel que coube ao PT, por exemplo, nas eleições de 2002. Lula, um político demagogo e de extraordinária capacidade de expressão, seguidamente derrotado em eleições presidenciais, sinalizava com as bases de uma sociedade mais homogênea e menos distorcida do ponto de vista econômico. Sem dúvida que seu governo foi responsável por trazer os brasileiros abaixo da linha de pobreza para uma condição econômica menos deplorável, muito mais por conta de uma política assistencialista garantidora de votos do que por mudanças em pilares econômicos que teriam introduzido essa massa na sociedade de uma outra maneira (capacitação como citado acima, por exemplo. Ensinar a pescar no lugar de entregar o peixe). A despeito da melhoria, o que se criou foi uma massa que vive às custas do governo e que gosta disso. Ao mesmo tempo, na medida em que perdeu a condição de oposição para se tornar governo, o partido enveredou pelas mesmas armadilhas, se é que se pode assim dizer, que atuam sobre quem está no poder: o desvio, a corrupção, a regalia em nome de poucos. O mensalão não é exclusividade do PT, como se sabe, embora tenha sido ele a ser pego com a boca na botija. Mas é o exemplo vivo que basta estar lá para não mudar o sistema.

A sociedade que nasceu marginal no século XIX assim permanece. E o ciclo vicioso que se criou é a garantia que nada mudará enquanto não houver um esforço absurdo para desconstruir o sistema, começando pela base educacional e garantindo oportunidades para quem se dispõe a progredir e contribuir para o desenvolvimento econômico. Para encerrar, relato um exemplo de disparidade que mostra, ao final, porque estamos onde estamos e porque um país, que até menos de cem anos  não existia, encontra-se anos luz à frente:

A cidade é Tsfat, norte de Israel. Pequena, me lembro de ter visto apenas dois postos de gasolina. Parei em um para abastecer antes de retomar viagem para Tel Aviv. Havia um funcionário no posto, um garoto de 18/ 20 anos, que habilmente abastecia três carros ao mesmo tempo em que passava os cartões e registrava os débitos (as bombas de gasolina são programáveis pelo valor desejado, dá pra fazer algumas coisas ao mesmo tempo). Mesmo com o posto cheio, não foram mais do que cinco minutos. Cortamos agora para São Paulo, posto Ipiranga, aquele que tem tudo. Posto vazio, encosto na bomba. Três funcionários. Um coloca gasolina em um outro carro, outro está tirando uma nota no caixa, o terceiro passando um pano em um carro que está parado mais ao fundo, provavelmente saído da lavagem. Passam-se dois minutos e eu ali parado, sem ser atendido, religo o motor e dou sinais que vou sair. Ninguém se manifesta. Vou embora. A vida segue.


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